sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Lançamento

A editora Atlas está organizando, na Livraria Acadêmica (Rua Costa Barros, 901, Aldeota - Fortaleza/CE) coquetel de lançamento dos livros que mais recentemente eu e o meu pai publicamos. Será na próxima quinta-feira, 4/3/2010, a partir das 19:00. Estão os leitores do blog todos convidados!







terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Por gentileza, Fortaleza

Recebi por e-mail, da Professora Deubia, texto (abaixo reproduzido) que veicula idéias a respeito das quais venho meditando há algum tempo. Tenho até post em preparação sobre elas, que não tem, contudo, o estilo do que se segue. Acho que, conquanto ela se reporte à Fortaleza, aplica-se às principais cidades do Brasil.

Por gentileza, Fortaleza

Na praia, quero ouvir o barulho do mar. No teatro, só o espetáculo. No cinema, o filme. Na sala de aula, a aula. Em casa, sons que não incomodem a vizinhança. Na praça, o buchicho das conversas. Nas igrejas, rezar baixinho: os deuses não são surdos. Deixar profissionais e pacientes atravessarem uma dura noite em hospital sem som de carro. No Passeio Público e no jardim do TJA, quero ouvir passarinhos. Vivo em Fortaleza. Quero viver em outra cidade: Fortaleza sem som automotivo. Quero mais: calçadas livres, ruas limpas, iluminadas, transporte público decente. Um dia tocado por "Bom dia" ao desconhecido que passa, movido a "Por gentileza", "Com licença", "Por favor" e "Muito agradecida". Ainda que não saibamos, estamos exauridos pela grosseria que não cessa de prosperar na cidade. Do ônibus ou da Hilux, por gentileza, não jogue lixo na rua. Não encontrar lixeira não é desculpa: leve um saquinho na bolsa. Respeite o ciclista: para 7da cidade, a bicicleta é o único meio de transporte. A vaga para deficiente é para portadores de deficiência... A fila é para todos, todos temos pressa ­ ainda que não saibamos como inventamos uma vida assim - e não precisamos de lei para dar passagem aos velhos, às pessoas com crianças, às mulheres grávidas: é só se colocar no lugar do outro. Miúda, eu já sabia que dar o lugar aos mais velhos era uma regra que valia sempre no ônibus, na fila... Por gentileza, não buzine: se estou parada é porque engarrafamos a vida. É cada vez mais difícil o ir-e-vir mais banal. Vai para a balada, ao Centro ou ao estádio? Com tanta grana, por que não pega um táxi? Sobretudo, ao deitar e ao acordar, lembre-se: não existe só você no mundo. Não grite; não chame o garçom ou a vendedora com um "Ei!"; saiba que muitas vezes seu celular pode ficar desligado e o mundo continuará girando. Quero viver em Fortaleza assim: nos 365 dias do ano, com a civilidade dos dias extraordinários. Ainda ressoa o relato da amiga moradora da Santos Dumont que desceu a João Cordeiro a pé para o Réveillon na praia, à vontade na rua, sem pânico em relação ao outro: sim, porque o medo incorporado é acionado a cada encontro com quem quer que seja. É um alento saber do casal amigo que voltou do Réveillon fazendo o caminho contrário, pegou um ônibus na mesma Santos Dumont às duas da manhã e foi para casa, prática comum para quem mora em uma cidade que sabe viver. Quero sim a civilidade da Domingos Olímpio no Carnaval. Senhoras levando cadeiras de casa para ver o desfile, crianças brincando, muitos mundos partilhando um mesmo espaço. Como no Pré-Carnaval no Jardim das Oliveiras, reunindo o time de futebol e o bloco do bairro com a Escola de Samba Império Ideal: não lhe conheço, não sei quem você é, talvez não nos encontremos nunca mais, mas vivemos juntos e precisamos, você e eu, cuidar de nós mesmos e cuidar da cidade. Cuidar da vida (na cidade) é uma tarefa cotidiana e coletiva. Agora está na nossa mão, por exemplo, desligar a violência do som automotivo. O paredão de som é pago. O silêncio é gratuito. Tem gente fazendo negócio com o nosso silêncio. E criando um lastro de brutalidade. Nunca quis isso. Agora, por gentileza, não fico calada. Viver com o outro é nosso aprendizado diário. Eu quero aprender!

Izabel Gurgel dirige o Theatro José de Alencar com Silêda Franklin

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Invictus e Amartya Sen


Assisti ontem à noite ao filme Invictus, com Morgan Freeman e Matt Damon. É muito bem feito e bem dirigido (Clint Eastwood). Há certa semelhança - embora a história seja completamente diferente - com Gran Torino, outro (excelente) filme dirigido por Eastwood: ambos tratam do preconceito e da tolerância. Isso significa que, para quem gosta de temas como multiculturalismo e direitos humanos, a diversão proporcionada pelo filme é ainda maior.
Não pretendo, aqui, comentá-lo, narrar sua história e menos ainda abordar os diversos (infinitos?) aspectos dele que podem ser examinados. Desejo fazer apenas dois registros rápidos.
O primeiro é o de que o cinema, o teatro e a literatura retratam (uma maneira de ver) a realidade. Assim, podem servir de instrumento para a análise de diversos temas, sejam científicos ou filosóficos. Afinal, ciência e filosofia são construídas em torno da realidade - ou da visão que temos dela -, seja sensível (o que é o caso, predominantemente, da ciência), seja suprassensível (precipuamente o que se dá com a filosofia). Um bom filme, ou um bom livro, portanto, podem ser excelente ferramenta para o estudo de temas científicos ou filosóficos. Algum conhecimento prévio, ou a orientação de alguém que o tenha, é importante, mas não essencial.
O segundo registro, diferente mas associado ao primeiro, é o de que percebi grande afinidade entre o que ocorreu no filme e as idéias de Amartya Sen veiculadas no livro "Identity and Violence". Já escrevi no blog, muito rapidamente, sobre esse livro. Foi em um post sobre um amigo meu que (quando era criança!) fantasiou-se de Robin e foi assim para o colégio, por engano, em um dia que NÃO ERA o da festa à fantasia...

Bom, mas a idéia central, muito resumidamente, é a seguinte: há uma tendência natural, na criatura humana, a sentir empatia por pessoas consideradas "do seu grupo", e a sentir aversão àquelas dos "grupos rivais". Basta lembrarmos de certas torcidas de times futebol adversários, de tribos adolescentes, ou de partidários de candidatos a qualquer cargo eletivo (até da OAB), para vermos como isso é verdade.
Ocorre que nenhum ser humano se caracteriza, ou tem a sua individualidade determinada, pela pertença a UM grupo. Todos pertencemos a vários ao mesmo tempo, e se somos "adversários" de alguém em relação a determinado grupo, somos colegas em vários outros. Veja-se, por exemplo, o caso do torcedor do Fortaleza que, encontrando um torcedor do Icasa, sente por ele empatia por pertencerem ambos ao grupo dos torcedores de times da terceirona... hehehe. Ou, brincadeiras a parte (eu nem sou torcedor de time nenhum!), de dois torcedores de times rivais que, não obstante, gostam ambos de pescar, ou têm ambos filhos com deficiência visual. A "raiva" que naturalmente sentiriam um do outro pelo fato de pertencerem a times rivais é neutralizada pelo fato de pertencerem ao mesmo grupo, dos amantes da pescaria, ou dos que têm filhos com um mesmo problema de saúde.

Sen explora essa questão para destacar que não se deve super-estimular em alguém o sentimento de pertença a um grupo isolado (esquecendo-se dos demais), pois isso leva de forma irremediável à violência. Dizer que existem - e essa é a tônica do livro - "ocidentais x orientais", que são radical, intrinseca e essencialmente diferentes, coloca uns e outros em lados opostos de uma batalha, sem possibilidade de conciliação. Algo como "humanos" contra "não-humanos". Ou "eles" contra "nós".
Em verdade, todos pertencemos ao grupo dos seres vivos (pelos quais deveríamos ter alguma empatia), em seguida dos animais, dos mamíferos, depois dos seres humanos, para só então, após tantos grupos em comum, começarem as separações, que mesmo assim não são absolutas porque, como já apontado, ninguém faz parte, como ser humano, apenas de um grupo isolado. O sujeito pode ser muçulmano e o outro católico, mas ambos torcedores do mesmo time, praticantes do mesmo esporte, ou amantes da mesma música. Basta imaginar um cara - para voltar de certo modo ao Robin - que odiava outro, um verdadeiro mala, até o dia que descobriu serem ambos vidrados em Dire Straits: - Opa! Ele até que é gente boa...
Fazia algum tempo que eu havia lido Identity and Violence. Foi entre dezembro de 2008 e março de 2009, mais ou menos. Mesmo assim, ao assistir a Invictus, parecia que eu estava (re)lendo suas páginas e presenciando a demonstração empírica (presumindo que na realidade as coisas se deram tal como representadas no filme) das idéias de Sen.
Mandela foi inteligente ao não ser tão intolerante quanto haviam sido com ele. Afinal, todos ali eram sul-africanos e estavam envolvidos em projeto comum. Os resultados positivos foram percebidos logo em seguida, mas é preciso admitir que, dadas as fraquezas humanas, é difícil alguém fazer o que, no filme, ele fez. Mas a questão da identidade e da violência mostra-se nítida quando a seleção de rúgbi começa a progredir na copa do mundo. Há uma cena bem ilustrativa disso, em que um garotinho negro fica mexendo no lixo próximo ao carro de uns policiais brancos. Ele apenas finge revirar o lixo, sem pressa e sem nunca terminar de fazê-lo. O que deseja, na verdade, é um pretexto para ficar próximo ao carro, onde os policiais ouvem, pelo rádio, a narração do jogo. Ele quer ouvir também.
No início, os policiais o repreendem duramente por estar a mexer no lixo. Ele, mesmo assim, continua revirando, pegando latas e deixando-as cair novamente... Vai ficando, se aproxima, senta na calçada... Pouco depois, estão se abraçando a cada ponto marcado pelo time do seu país.
Pode haver alguma poesia e romantismo. As coisas, na realidade, até podem não ter ocorrido tal como retratadas. A África do Sul certamente ainda tem seus problemas. Mas, apesar de tudo, o filme dá (ou reproduz) belíssima lição de tolerância e de paz.

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

A filosofia e as crianças

A mente infantil me fascina. Para entendê-la melhor, às vezes procuro lembrar de quando eu era criança. Lembro que eu tinha dúvidas que iam desde ao que ocorria com a comida, quando a ingeríamos, até a existência de Deus.
A propósito de Deus, o maior sufoco que passei foi quando tive que fazer primeira comunhão, aos nove anos, já que estudava em um colégio católico.
Uma fila imensa. Todas as crianças da quarta série aguardavam para "se confessar". A professora havia dito que quem mentisse para o padre teria problemas com a hóstia, que não se dissolveria e grudaria na boca para sempre. Talvez o fato de alguns de meus professores de religião tratarem as crianças como idiotas tenha me afastado ainda mais dela.
Bom, mas a minha aflição era: como dizer ao padre que tenho dúvidas sobre a existência de Deus? Serei considerado um herege. Dirão que é um absurdo. Talvez eu seja até expulso do colégio... Essa ansiedade ia fazendo com que eu permitisse a todos os meus coleguinhas que passassem na minha frente na fila... Até que o último se confessou, e saiu. O padre estava em uma cadeira em um canto recuado de um dos corredores do colégio, e não via as crianças que faziam fila para conversar com ele, assim como as crianças da fila não viam o que se passava no local da "confissão".
Quando o último aluno - antes de mim - se confessou e saiu, vacilei por alguns minutos. Entro ou não? O que digo? Pensava que o fato de eu não acreditar me autorizaria a mentir para ele - inventando que acreditava e contando alguns pecados. Afinal, tinha-se aí um paradoxo: se eu não acreditava, para mim nada daquilo fazia sentido, e não acreditar não poderia ser errado. Mas o problema é que eu apenas tinha dúvidas. Como, sinceramente, acho que, no fundo, todos têm. Eu apenas tinha a coragem de admitir.
Bom, mas o que importa é que esses momentos de vacilação certamente fizeram o padre presumir que a fila havia acabado. Finalmente tinha terminado o suplício de ouvir mais de 200 meninos e meninas contarem os seus pecados. Ele já arrumava suas coisas e se levantava da cadeira quando entrei. Olhou para mim incrédulo, como quem pensa "não acredito, ainda tem esse!", e disse: - Já sei, já sei, mentiu para o pai, gritou com a mãe, bateu na irmãzinha, reze cinco pais nossos e cinco ave marias e vá-se embora!
Eu não me lembrava de ter mentido para meu pai, e nem de ter gritado com a minha mãe. Irmãzinha eu nem tinha. Certamente tinha os meus "pecados", que talvez fossem até mais graves que esses, mas foi um alívio. Fui até a capela, fingi (?) que rezava, e voltei para a sala de aula com uma ambígua sensação de alívio.

Narro esse episódio apenas para registrar que, na minha lembrança, usando-me como experimento, as crianças pensam. Podem não ter as respostas certas para as perguntas, mas têm as perguntas, e em filosofia, como em ciência, as perguntas são muito, mais muito mais importantes que as respostas que se lhes dão.
Quando nasceu minha filha, que hoje tem 9 anos, usei-a como objeto de estudo para perceber como se forma a cognição, o pensamento, o raciocínio... Como surgem as palavras, como se aprende a conversar, a usar a linguagem... E, o que mais me surpreendeu: como surgem os questionamentos, e como eles são profundos.
Não por outro motivo, a dedicatória do meu "Processo Tributário", publicado em 2004, é a seguinte:

À Lara, que, não obstante tenha apenas quatro anos, muito já me ensinou, com seus simples mas profundos questionamentos, e com sua lógica infalível.

Depois, na dedicatória do "Por que dogmática jurídica?", escrevi:

À Lara, que, com doçura e inteligência, retira o cunho dogmático de qualquer afirmação que se lhe faça. Embora já caminhe para os seus oito anos, não perdeu, e espero que nunca perca, o hábito de a tudo questionar, com desconcertante singeleza: - Por quê?


Na Turquia, com os olhos brilhando diante da diversidade cultural, a Larinha questionou: - Papai, como saber qual “certo” é o certo?
Pergunta tão singela quanto profunda, que me conduziu a outra viagem... Assim teve início este livro, que a ela dedico com carinho.


Não quero dizer, insisto, que eu fosse, quando criança, e minha filha seja, hoje, mais inteligentes que outras crianças. De forma alguma. Acredito que todas as crianças têm a curiosidade necessária para fazerem boas e profundas perguntas filosóficas, que os adultos, embebidos no senso comum e nas necessidades práticas do cotidiano, deixam de formular. Quando uma criança encontra um adulto que a respeita como ser pensante, o resultado pode ser muito proveitoso.

Outro dia, por exemplo, depois de refletir bastante, um dos meus filhos gêmeos, de 4 anos, perguntou: - Pai, por que existe o mal?

Não há nada mais filosófico do que isso, e perguntas desse tipo, não é difícil constatar, são feitas todos os dias pelas crianças. O difícil é elas se depararem com um adulto que compreenda a profundidade de suas perguntas e tenha paciência de, com elas, pelo menos iniciar a busca por respostas.


Eu já tinha essa concepção faz algum tempo, como as dedicatórias dos meus livros podem indicar. E, para minha alegria, encontrei em uma das minhas últimas visitas à livraria um excelente livro que trata justamente disso. É o "A Filosofia e a Criança", de Gareth B. Matthews (Martins Fontes, 2001). O autor explora com bastante cuidado e seriedade a tendência filosófica que as crianças têm em certa fase da vida. Não deve ser por outra razão, aliás, que se diz dos filósofos que devem ter a curiosidade própria das crianças... Recomendo a leitura.


Bom, e quanto à Lara impressionada com a diversidade cultural, na Turquia, a foto ao lado mostra o momento em que ela teve de cobrir-se para entrar em uma mesquita. Confesso que a curiosidade dela, e as perguntas que me fez, serviram-me de estímulo para ver com outros olhos aquela realidade e aquele país cuja visita também recomendo enfaticamente.

Súmula Vinculante 30

Recebi e-mail de colega e leitor do blog (Ticiano Alves) noticiando a suspensão, para melhor exame, da Súmula Vinculante 30, referida no post anterior. O STF entendeu necessário analisar com mais cautela a abrangência da súmula, pois existiriam situações que por ela poderiam ser alcançadas e que não deveriam sê-lo. Eis a notícia:


Quinta-feira, 04 de Fevereiro de 2010

Plenário suspende publicação de nova súmula vinculante sobre partilha do ICMS para melhor exame

Após uma questão de ordem levantada pelo ministro José Antonio Dias Toffoli no início da sessão plenária de hoje (4), os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiram suspender a publicação da nova súmula vinculante (que receberia o número 30), decorrente da aprovação ontem (3) da Proposta de Súmula Vinculante (PSV 41), que trata da retenção, pelos estados, de parcela do Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICMS) destinado aos municípios. Foi suspensa a publicação da nova súmula vinculante para uma melhor análise.

Isso porque a proposta de redação aprovada ontem restringia a inconstitucionalidade à lei estadual que, a título de incentivo fiscal, retém parcela do ICMS que seria destinada aos municípios. Mas o ministro Dias Toffoli verificou que há precedentes envolvendo outra situação, que não especificamente o incentivo fiscal. Trata-se de uma lei estadual dispondo sobre processo administrativo fiscal de cobrança e compensação de crédito/débito do particular com estado. No caso em questão, houve uma dação em pagamento, em que foram dados bens que não foram repartidos com o município.

VP/LF


http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=119642

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Novas súmulas vinculantes

Já estou vendo que vai ser quase impossível manter atualizado meu próximo livro, "Direito Tributário nas Súmulas do STF e do STJ".
Quando escrevi o CTN anotado, pensei que seria o mais difícil de manter atualizado. Está sendo o mais fácil. Da primeira (2007) para a segunda (2009) edição a mudança mais significativa foi a capa, e se sair uma terceira, agora em 2010, incluirei pouquíssima coisa. O Processo Tributário tem sido mais difícil, pois a lei processual tem mudado o tempo todo. Mas nada se compara à velocidade com que nossos Tribunais Superiores elaboram súmulas. O livro está no prelo e já saíram mais três. Talvez seja a velocidade do mundo moderno, e das informações que nele se produzem e se fazem necessárias. Para isso, aliás, existe a internet.

As súmulas vinculantes recém editadas são as seguintes:

Súmula Vinculante 28: “É inconstitucional a exigência de depósito prévio como requisito de admissibilidade de ação judicial na qual se pretenda discutir a exigibilidade do crédito tributário”.

Súmula Vinculante 29: “É constitucional a adoção no cálculo do valor de taxa de um ou mais elementos da base de cálculo própria de determinado imposto, desde que não haja integral identidade entre uma base e outra”.

Súmula Vinculante 30: "É inconstitucional lei estadual que, a título de incentivo fiscal, retém parcela do ICMS pertencente aos municípios".

Até acho que não era matéria para editar súmula vinculante. A primeira cuida de assunto já praticamente superado, aliás comentado em post passado. A segunda acolhe tese que meu pai defendeu há muito tempo, em parecer que fez para a Prefeitura de Fortaleza em 1997 ou 1998, e que foi publicado no livro "Direito Tributário Aplicado". É preciso destacar, contudo, que não basta não haver a total identidade. É preciso que o elemento guarde relação com o custo aproximado do serviço ou com o grau de utilização deste pelo contribuinte. No caso do parecer, cuidava-se da área do imóvel sendo levada em consideração para o cálculo (juntamente com outros fatores) da quantidade de lixo nele produzida. E finalmente, a terceira, consiste em aplicação da regra constitucional - recorrente do princípio federativo - de que os repasses relativos à partilha das receitas tributárias não podem sofrer condicionamentos além daqueles já levados a efeito pelo texto constitucional. A idéia, aliás, estava já contida na Súmula 578/STF, editada em 1976.

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Jogo de empurra entre STJ e STF

Deve ser aquilo que um Ministro do STJ chamou de "jurisprudência defensiva". Decisões não muito razoáveis, para dizer o menos, mas que teriam a seu favor uma excludente de ilicutude: seria a legítima defesa do Tribunal contra o excesso de processos que põe em risco a sua viabilidade.
Refiro-me, dessa vez (mas os exemplos são muitos, e diversos), a um jogo de empurra no exame de questões constitucionais.
O STJ não as aprecia, por considerar que competem ao STF. Este, por sua vez, tampouco delas conhece, por entender que a ofensa à Constituição seria "reflexa", devendo ser examinada pelo STJ à luz da legislação infraconstitucional. E termina que nenhum dos dois se manifesta sobre o problema.
Estou preparando artigo sobre o assunto, no qual ele será tratado com uma profundidade um pouco maior do que aquela pertinente aqui no blog. Quando estiver pronto, posto uma síntese dele. De qualquer modo, acredito que o cotejo das duas decisões, sobre o mesmo assunto, é suficiente:

O entendimento do STJ:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO.
RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. REFIS. LEGITIMIDADE DA EXCLUSÃO POR MEIO DO DIÁRIO OFICIAL E DA INTERNET. AFASTAMENTO DA LEGISLAÇÃO SUBSIDIÁRIA (LEI 9.784/99).
1. Nos termos do art. 69 da Lei 9.784/99, "os processos administrativos específicos continuarão a reger-se por lei própria, aplicando-se-lhes apenas subsidiariamente os preceitos desta Lei".
Considerando que o REFIS é regido especificamente pela Lei 9.964/2000, a sua incidência afasta a aplicação da norma subsidiária (Lei 9.784/99).
2. Não há ilegalidade na exclusão do REFIS sem a intimação pessoal do contribuinte, efetuando-se a notificação por meio do Diário Oficial e da Internet, nos termos do art. 9º, III, da Lei 9.964/2000, c/c o art. 5º da Resolução 20/2001 do Comitê Gestor do Programa.
3. O exame de suposta contrariedade a princípios positivados na Constituição Federal, mesmo que para fins de prequestionamento, é alheio ao plano de competência desta Corte, porquanto trata-se de matéria afeta à competência do Supremo Tribunal Federal.
4. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no Ag 902614/PR, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 13/11/2007, DJ 12/12/2007 p. 397 - grifei)


Agora, o STF, a quem, de acordo com o STJ, compete examinar o assunto:

RE 551476 AgR / DF - DISTRITO FEDERAL
AG.REG.NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO
Relator(a): Min. MENEZES DIREITO
Julgamento: 05/05/2009 Órgão Julgador: Primeira Turma
Publicação
PROCESSO ELETRÔNICO
DJe-162 DIVULG 27-08-2009 PUBLIC 28-08-2009
Parte(s)
AGTE.(S): DIGIARTE INFORMÁTICA LTDA.
ADV.(A/S): JOSE LUIZ MATTHES E OUTRO(A/S)
AGDO.(A/S): UNIÃO
ADV.(A/S): PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL
Ementa

EMENTA Agravo regimental no recurso extraordinário. Exclusão do REFIS. Legislação infraconstitucional. Princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. Ofensa reflexa. Precedentes. 1. As questões referentes à exclusão de contribuinte do Programa REFIS estão adstritas ao âmbito da legislação infraconstitucional. 2. As alegações de afronta aos princípios do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório, dos limites da coisa julgada e da prestação jurisdicional, se dependentes de reexame de normas infraconstitucionais, podem configurar apenas ofensa indireta ou reflexa à Constituição da República. 3. Agravo regimental desprovido.
Decisão
Decisão: A Turma negou provimento ao agravo regimental no recurso
extraordinário, nos termos do voto do Relator. Unânime. 1ª Turma,
05.05.2009.


E agora, quem vai examinar se a legislação do REFIS viola, ou não viola, os princípios constitucionais apontados?